domingo, 27 de janeiro de 2008

a uma Julieta (e a outros)

*
*
*
Enfim, entrego-me à loucura. Saindo da condição de perspicaz observadora, entrego-me às suas palavras, doce Julieta: você também sabe que minha intensidade acontece bem longe de olhares todos. Acontece à parte. No canto da festa, no escuro da razão. Não é a vocês que respondo hoje. É a mim. Porque minha vida é de uma intensidade que quase ninguém vê. Secreta. Rebeca é um sopro. Rebeca é uma cortina transparente, um véu de noiva. Uma florzinha vermelha escondida no mato. Digo-me hoje em terceira pessoa porque assim não me dói na carne que mal me sustenta:

Rebeca conhece, sim, esse amor bonitinho de bordar toalhas. E também vive o tal gozo queima-corpo. Arde. Certa vez um amante ressurgiu de uma gaveta de recordações. Um amante antigo. De nome Haroldo. E foi então que a coisa toda aconteceu: ele olhou para Rebeca com desejo e Rebeca recebeu o desejo. Nada de subterfúgios pra dar outro nome ao desejo. Não era mais aquela pureza dos tempos delicados. Era simples assim: ela diria: "vem, benzinho, que aqui tá escuro e ninguém vai ver..." E ele a tomaria pela cintura, tocariam-se bem embaixo onde tudo sempre começa. Não haveria amanhã. Fossem tão simples as palavras do gozo ("eu quero, tu queres?"), e não haveria motivo para um vocabulário tão extenso.

O amor aprendeu mais cedo essas sutilezas. Sim, Julieta, esse amor de bordar toalhas. Ele fala com olhos de menino, ri que ri e depois repousa no colo. Parece que o mundo inteiro é feito de borboletas amarelas. E não se engane: não é grandioso. É uma simples promessa: promete que o amanhã existe e que lá (no amanhã) você acordará tendo uma mão firme na sua mão e alguém que amará a toalha bordada por seus dedinhos feridos pela agulha fina. Esses dedinhos delicados sangrando assim.

Chame o amor como se cantasse em uma língua desconhecida. Deslize. E chame o gozo, busque-o sem pudor. Diga que quer. Peça com um pouquinho de safadeza, diga palavras que não escreveria num texto bonito - palavras que só podem ser ditas no escuro. Mesmo que esteja bem claro. Esses dias eu diria que às vezes é necessário queimar os olhos. Levar o ardor dos sonhos pra uma realidade concreta. O príncipe das telas de cinema para o corpo do homem que dorme quietinho ao seu lado. Todos os amantes do mundo para a sua cama. Em sonhos aguantes de quem sabe que o desejo maior é irrealizável e, mais que isso, menos desejado do que nos parece.


Vocês querem o que, afinal?

*
*
*

Com amor,

Rebeca

Nenhum comentário: