quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Fragmento #3

Meus amores pequenos,

Isso é também morte de atrizes e escritoras. Eu que coleciono momentos de morte não estou conseguindo viver agora. Não consigo mais achar o peso deste sonho, seu ponto de concretude para que possa creditar. De que me adianta a leveza dos sonhos?, eu que vou me fazendo de pesadelos.

À escritora, é como se arrancassem seu ventre de papel em uma operação assistida por uma classe inteira. E então, lançasse aquele olhar gélido ao corpo dissecado deixando explícita a arrogância de um: invente-se!! Ande! Queremos ver agora, sem substrato algum.

À comediante, é como se atassem todos os seus membros bem rentes ao corpo pequeno. Pendurassem nela sacos pesados de areia e vendassem seus olhos, entregando em suas mãos um papel dramático ainda nem decorado que deve, contudo, ser vivido com leveza e graça.

Sei que prometi voltar apenas durante a noite, mas não pude resistir à intenção.

A sensação de que não estou conseguindo. Este é o gozo mais rígido que já precisei ter.

Entendam-me bem meus amores, não sou ator nem escritor. Apareço em curtíssimos instantes de alegria em lugares diferentes: sou o gozador.

Acho que tenho que pedir licença – tarde demais, para a minha desordem. Mas é que o instante é todo assim, coisa louca que vai puxando a gente. É um punho só para fotografar em palavras o que vai ganhando existência em mim. Já tentei deixar o punho livre e solto, tentar escrever de uma vez só e psicografar o que vai ganhando consistência. Fui acometido por uma tal velocidade que nem mesmo reticências aqui cabem (Reticente não é o termo). De tal forma que o que se seguiu foi um enorme buraco na folha que não vou reproduzir aqui porque já estou me debatendo demais.

E ainda sinto que tudo isso não basta. Como se não bastasse minha desordem tosca. Meu corpo todo é palco de batalhas. Nele cortam corpo afora Führers portugueses e franceses e uma mão de ferro inglesa. Todos eles generais, nominais e substantivos. Nada contra substâncias: ao tentar filmar o instante em palavras – quando se seguiu todo aquele rombo enorme – foi por um triz que não passei de líquido para vapor. Tenho medo de ser gaseificado. E é também porque sou bom filho que preciso ceder variavelmente a artigos definidos, pronomes, tempos – o caralho a quatro.

Hoje encontrei com um dos grandes. Fui atormentado até chegar ao ponto de precisar me desenrolar aqui. E pela primeira vez cabe reticências, porque há segredos que me recuso a contar até mesmo aqui. Mas não se preocupem, o que escrevo aqui é bobagem minha, é coisa de ninguém. E isso é minha pequena arma, meu puro dengo.

Vou parar novamente. É que agora preciso de um pouco mais de coragem para escrever as palavras que achei. Talvez volte, mas não esperem por mim.

Em uma briga de pronomes...

D. L.

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