segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Pensou que eu não vinha mais, pensou? Pois vim e trouxe comigo o Chico. É que não sei falar de tempo ainda, ando embananado demais com o instante, que é de outro tempo. Sinto que o instante é mais vasto: nele, que ainda não achei o termo próprio, cabe muita coisa não só ao mesmo tempo, mas numa variabilidade terrível dele. Isso sei simples, sei sem explicação. E se não fosse assim já teria sabido. É uma daquelas coisas que só se chega ao conhecimento em Deus, ou é Deus que chega ao conhecimento em mim? No instante tem muito e pouco tempo. Disseram-me uma vez que o instante é tão agora que por um triz não é futuro. Vivo com você sempre na iminência de: . Abarrotado de coisas, às vezes beiro a loucura. Passo a palavra agora para Chico.

Tempo e Artista

[Chico Buarque – in: Paratodos]

Imagino o artista num anfiteatro
Onde o tempo é a grande estrela
Vejo o tempo obrar a sua arte
Tendo o mesmo artista como tela

Modelando o artista ao seu feitio
O tempo, com seu lápis impreciso
Põe-lhe rugas ao redor da boca
Como contrapesos de um sorriso

Já vestindo a pele do artista
O tempo arrebata-lhe a garganta
O velho cantor subindo ao palco
Apenas abre a voz, e o tempo canta

Dança o tempo sem cessar, montando
O dorso do exausto bailarino
Trêmulo, o ator recita um drama
Que ainda está por ser escrito

No anfiteatro, sob o céu de estrelas
Um concerto eu imagino
Onde, num relance, o tempo alcance a glória
E o artista, o infinito.

Beijo de quem vibra em vossas mãos.

D. L.

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